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segunda-feira, 2 de maio de 2011

ÉPICA ONDA DE TORNADOS

fonte
www.metsul.com

Marcando o começo de maio, a MetSul Meteorologia publica o que consideramos ser um dos melhores trabalhos já feitos por nossa equipe de análise e descrição de um evento de natureza extrema. Os Estados Unidos foram atingidos entre quarta e quinta-feira por uma das mais terríveis ondas de tornados da história do país, de proporções avassaladoras e com destruição maciça em alguns locais. As tormentas causaram destruição em diversos estados, principalmente Alabama, Tennessee, Mississippi, Kentucky, Louisiana, Georgia e Virginia. O prejuízo financeiro deve ser o maior de uma onda de tempestades até hoje.

O pior ficou reservado para o Alabama, onde mais de duzentas pessoas morreram e mil foram feridas. O estado todo foi declarado em emergência pelo governo. Os violentos tornados (vídeos) cruzaram pelas áreas urbanas de duas das principais cidades do Alabama, Birmingham e Tuscaloosa. O estado que era terceiro na estatística histórica de mortos por tornados nos Estados Unidos passou para a primeira posição, superando Texas e Mississippi.

A Meteorologia dos Estados Unidos já alertava para um dia que poderia ser trágico. As áreas mais atingidas estavam sob alerta de "alto risco" pelo Storm Predicition Center, o centro de previsão de tempo severo do NOAA, a agência meteorológica do governo dos Estados Unidos. A condição de "high risk" somente é emitida em condições extremas e de elevado risco para a população, em regra coincidindo com tempestades assassinas.

As condições meteorológicas eram muito favoráveis à formação de tempestades severas e destrutivas. Ar muito quente e úmido em superfície com intrusão de ar frio em altura, o que gerava forte instabilidade, divergência significativa de vento (shear) em diferentes níveis da atmosfera com forte corrente de jato em baixos níveis pelas sondagens, sistema de baixa pressão em altura em deslocamento para o Sudeste americano e uma frente fria com avanço para Leste, associada à baixa em altos níveis da atmosfera, dividindo a massa de ar quente e instável a Leste da fria e seca para Oeste.

Diversos eram os sinais de que um evento significativo de tempo severo era iminente. Um dos indicadores usados pelos meteorologistas para previsão de tornados, o chamado Energy Helicity Index (sigla EHI), na manhã do dia 27, registrava valores extremos e raramente vistos.

O cisalhamento (shear) era tão significativo na quarta-feira, 27 de abril, que praticamente todas as nuvens de desenvolvimento vertical apresentavam sinais de rotação, ou seja, tinham potencial para gerar tornados. Sondagem atmosférica das 18Z daquele dia de Birmingham (BMX), cerca de três horas antes de devastador tornado atingir a cidade, acusava altos valores de shear (clique na sondagem para ampliar).

Aeronaves em aproximação no Aeroporto Internacional de Hastsfield, de Atlanta, para muitos o de maior movimento no mundo, tiveram que abortar procedimentos de pouso em conseqüência de forte vento de calda, o que altera a velocidade dos aviões e traz graves riscos de acidente. Piloto de um Boeing 737 que estava rumando para Atlanta, ao sobrevoar o Mississippi e o Alabama fotografou da cabine as nuvens sobre os estados e as células de tempestade que apareciam no radar onboard.

Imagens do satélite da agência espacial americana NASA que leva a bordo radares para medição de chuva indicaram, pelo corte vertical em 3D das nuvens de tempestade, que elas atingiam quase 17 quilômetros, uma altura impressionante. A linha de tormentas de caráter destrutivo se estendia da Louisiana até o Vale do Rio Ohio.

Duas grandes cidades foram atingidas pela onda de tornados na tarde do dia 27 de abril. Tuscaloosa e Birmingham, ambas no Alabama. As duas suportaram pesados danos materiais com destruição de bairros inteiros com estragos sem precedentes nestas cidades. O mesmo tornado que afetou Tuscaloosa foi que logo após provocou devastação em parte de Birmingham.

A primeira grande cidade do Alabama atingida por tornado foi Tuscaloosa. A tormenta chegou ainda durante o meio da tarde, com muito tráfego e pessoas na rua, o que acabou contribuindo para aumentar o número de vítimas. O tornado atrevessou a cidade.

Dezenas morreram, mas ainda há muitos desaparecidos. O tornado avançou sobre casas, prédios, centro comerciais, arrasando tudo . Hidrantes de incêndio solidamente instalados nas calçadas foram arrancados. A destruição foi total em vários pontos.

O prefeito de Tuscaloosa Walter Maddox descreveu uma condição surreal horas depois da passagem do devastador tornado. "Há partes da cidade que eu não reconheço", disse. Centenas de casas e prédios foram destruídos. O balanço com o número de construções afetadas é incerto, afinal o tornado arrasou até o prédio da Defesa Civil local.

Se as fotos aéreas dos danos e feitas em superfície são aterradoras, a destruição ainda é mais chocante se observada por imagens em alta resolução de satélite. Partes inteiras de Tuscalossa simplesmente deixaram de existir. As fotos divulgadas pela Digital Globe, empresa especializada neste tipo de monitoramento, mostram claramente o rastro de destruição deixado pelo tornado na cidade.

Outra empresa dedicada a imagens de satélite, a GeoEye-Google, também divulgou fotos das áreas mais afetadas em Tuscaloosa, comparando o terreno antes e após o tornado. A magnitude dos danos é chocante.

Os tornados eram tão grandes, com até três quilômetros de diâmetro em alguns casos, e tão intensos, que acabaram levando para distâncias de dezenas de quilômetros objetos leves como contas de luz ou telefone. Meteorologistas, até experientes, se defrontaram, então, com um novo conceito até então pouco conhecido denominado de "debris ball", ou "bola de destroços". Um radar Doppler localizado na Base da Força Aérea dos Estados Unidos de Columbus, no Mississippi, detectou uma "bola de destroços" quando tornado se aproximava da cidade de Hackleburg. O mesmo ocorreu em Tuscaloosa. Na imagem de radar abaixo, a "bola de destroços" está logo ao Sul do triângulo invertido que indica a localização do tornado. Esta particularidade na imagem do radar Dopller, observada ao Sul do eco em gancho (hook echo) costuma ser observada apenas em tornados intensos. A "bola" indica que a refletividade no radar gerada pelos destroços voando ao redor do tornado. Radares meteorológicos são desenhados para refletir gotas de chuva (pequenas), logo imagine os tamanhos e a quantidade de destroços presentes girando no ar para que se tivesse esta imagem.

Outra imagem impressionante e em 3D de radar, gerada pelo moderno software de visualização GrLevel3, mostra que o tornado que atingiu a cidade de Tuscaloosa tinha inclinação horizontal. Na imagem, igualmente, é perceptível a "bola de destroços".

O trabalho de classificação dos tornados será longo tamanha a quantidade de análise de campo a ser realizada pelas equipes do National Weather Service (NWS), mas é certo que o número de tornados EF4 e EF5, os mais intensos possíveis, será grande. Não se sabe ainda qual foi a magnitude do tornado que atingiu Tuscaloosa e Birmingham, apesar das especulações entre EF4 e EF5, mas a Meteorologia dos Estados Unidos já divulgou que a supercélula de tempestade que provocou o tornado nas duas cidades percorreu incríveis 380 milhas (611 quilômetros), pouco menos que a distância entre Porto Alegre e Curitiba, tendo durado 7 horas e 24 minutos do condado de Newton, no Mississippi, até o condado de Macon, na Carolina do Norte. Foi divulgada uma fotocomposição de imagens geradas por radar de praticamente todo o tempo de vida desta supercélula com sua evolução.

O tornado que atingiu Tuscaloosa avançou para Birmingham, alcançando a cidade ao fim da tarde. Por muito pouco a área central (Downtown) não foi atingida, mas zonas logo ao redor sofreram um impacto direto. O tornado era de enormes dimensões, fator decisivo para que os danos fossem maciços e numa vasta área de Birmingham. O jornal local descreveu os danos como épicos.

Um dos momentos mais marcantes do acompanhamento da onda de tornados foi ver meteorologista de um canal local de televisão de Birmingham contrariar a ordem dada à equipe de estúdio para buscar imediatamente abrigo e permanecer no ar sem interrupção mostrando a chegada do tornado e orientado a população sobre quais regiões da cidade estavam para ser atingidas.

"A cidade se foi". Assim descreveu o prefeito de Smithville, pequena cidade de não mais que mil habitantes do estado do Mississipi que foi devastado completamente por tornado no dia 27. Prédios e casas nas áreas urbana e rural viraram ruínas. Prefeitura, lojas, a polícia e a funerária local viraram uma pilha de escombros. Asfalto de ruas foi arrancado pela força do vento. Automóveis, jogados a centenas de metros de distância, viraram peça de ferro-velho e mal podiam ser reconhecidos.

Foi o tornado mais intenso no Mississippi desde o tornado de Candlestick Park de 3 de março de 1966. Imagens aéreas e no solo da região de Smithville mostram o rastro do tornado e que por onde ele passou restaram apenas ruínas. A área se transformou em símbolo da calamidade no Sul americano. Colchão de casal e até um cachorro, segundo depoimentos da imprensa, ficaram enrolados e cravados em árvores pela força do vento.

A destruição dos tornados não se limitou a Tuscaloosa, Birmingham e Smithville. Diversas outras cidades da região, em especial no Alabama, Mississippi e Georgia testemunharam devastação. São os casos de Pratt City, Cullman, Ringgold, Concord, dentre outras.

O cinema levou às telas em 1996 em Twister a fúria dos tornados nas Planícies Centrais americanas, mas a realidade em Smithville e outras cidades foi muito pior que a ficção. Em cena de Twister, a personagem Melissa pergunta se existe tornado F5 (EF5) e como ele seria, ouvindo como resposta: "o dedo de Deus". O tornado que varreu do mapa Smithville (Mississippi) na quarta-feira foi um EF5, com vento de até 330 km/h, máximo da nova escala de Fujita dos tornados. Já o tornado que atingiu Hackleburg, cidade do Alabama, também foi classificado como EF5 pelo NWS. Como as avaliações segue, é alta a possibilidade de novas confirmações de tornados de categoria máxima. Desde que começou a ser usada em 2007, apenas Greensburg (Kansas), em 2007, e Parkersburg (Iowa), em 2008, tinham tido tornados EF5 nos Estados Unidos.

O NOAA divulgou balanço das tempestades no dia 30 de abril (sábado) com base na sua estatística histórica de tornados iniciada em 1680. Conforme estimativa, 288 tornados se formaram na onda de tempo severo entre 8h EDT (hora de verão de Leste dos Estados Unidos) de 26 de abril e 8h EDT do dia 28, 211 apenas nas 24 horas entre os dias 27 e 28. O maior número prévio era de 148 tornados entre 3 e 4 de abril de 1974.

O balanço provisório de 345 mortos (até 30/4), mais de 330 só nas 24 horas entre os últimos dias 27 e 28 de abril, fazia com que a onda de tornados de 2001 tivesse o maior número de vítimas fatais provocadas por tornados em intervalo de dois dias nos Estados Unidos desde 5 e 6 de abril de 1936, quando no ‘Tupelo-Gainesville Outbreak’ morreram 454 pessoas. Foi ainda o maior saldo fatal por tornados em 24 horas desde 18 de março de 1925, ocasião em que pereceram 747 pessoas, a maioria pelo ‘Tri-State Tornado’, o pior da história americana. Só o tornado que atingiu na quarta as cidades do Alabama de Tuscaloosa e Birmingham matou ao menos 65. Trata-se do maior número de mortos em único tornado em solo americano desde 25 de maio de 1955, quando 80 perderam a vida no Kansas, quase todos na localidade de Udall. O recorde pertence ao ‘Tri-State Tornado’ que atingiu Missouri, Illinois e Indiana em 18 de março de 1925 com 695 mortos.

A estimativa preliminar do NOAA é que ao menos 600 tornados tenham se formado nos Estados Unidos em abril , sendo que o recorde anterior em abril era de 267 em 1974. O recorde prévio absoluto mensal era de 532, em maio de 2003. A média de tornados em abril na última década nos Estados Unidos foi de 161. Cerca de 835 tornados teriam se formando no país até agora em 2011. O recorde é de 2004 com 1817. A média anual da última década é de 1274 tornados e maior tem o maior número de ocorrências.

O jornal USA Today, o mais lido dos Estados Unidos, publicou reportagem de capa na sua edição de sexta-feira (29/4) sob o título "Regras da natureza: alertar nem sempre é suficiente" em que analisa o alto número de mortos em plena era da tecnologia de informação e após tantos avanços na Meteorologia.

De fato, quase 400 alertas de tornados foram emitidos, o que não impediu tantas mortes. Com a tecnologia de hoje, os cientistas discutem o porquê de tantas vítimas. Só com abrigos subterrâneos era possível sobreviver a alguns dos tornados (vários com vento de 300 km/h) e muitas casas não tinham. Temporais horas antes ainda deixaram várias áreas sem luz e internet, impedindo que as pessoas recebessem alertas. Mesmo os populares rádios do NOAA (Weather Radio) que transmitem diretamente os alertas da Meteorologia tiveram interrupção de sinal em alguns pontos.

A MetSul Meteorologia vinha alertando meses antes que os Estados Unidos deveriam ter uma temporada de tempo severo muito ativa, citando 1974 como análogo, ano do ‘Super Oubreak’, a pior onda de tornados da segunda metade do século XX no país. Causas de ordem natural, e não interferência humana no clima, foram decisivas para tantos e tão intensos tornados ocorressem em abril de 2011. Um estudo encontrou pequena margem de correlação entre La Niña e tornados no país, mas outro indicou que sob condições de Pacífico frio, como seu no começo de 2011, há uma tendência maior de tornados mais intensos, de maior duração e de ondas com 40 ocorrências ou mais do fenômeno. Os principais eventos (Palm Sunday Outbreak de 1965, Super Outbreak de 1974 e agora 2011) se deram em anos de La Niña.

Os estados do Sul, Planícies Centrais e Meio-Oeste dos Estados Unidos são os que, pela climatologia histórica, registram a mais alta frequência de tornados (animação acima) devido ao encontro do fluxo de ar quente e úmido de Sul, do Golfo do México, com o ar mais seco e frio que vem do Norte ou Oeste. Não existem estudos que de forma inequívoca indiquem que o aquecimento global influencie em tornados. Uma linha de pesquisas sinaliza que ar mais quente está associado a maior retenção de umidade na atmosfera, o que intensificaria as tempestades, gerando mais tornados, mas por outro lado haveria redução da divergência de vento (cisalhamento), o que iria contra a tese no aumento dos tornados. (Escrito e produzido por Alexandre Aguiar da MetSul com apoio técnico do meteorologista Luiz Fernando Nachtigall e imagens da CNN, NOAA, AccuWeather, Mississipi EMA, Twitter, Facebook e reproduções de jornais)

Autor: Alexandre Amaral de Aguiar
Publicado em 01/05/2011 05:59

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